Nesta semana, a Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público contra o professor Vinícius Pompeo, 37 anos, de Santa Maria. Com isso, ele virou réu por suposto estupro de vulnerável e importunação ofensiva ao pudor. Ele já havia sido indiciado pelos mesmos crimes após investigação conduzida pela Polícia Civil em agosto.
Os casos vieram à tona depois que uma ex-aluna do professor usou as redes sociais para falar de situações de assédio e recebeu relatos de outras meninas que diziam ter passado pela mesma condição. O Diário conversou com três das vítimas dos abusos. Elas terão a identidade preservada. Em comum, todas carregam reflexos como a dificuldade de confiar em professores na vida acadêmica e o sentimento de alívio por terem sido escutadas.
Uma ex-aluna contou que o comportamento do professor causava constrangimento:
- Ele colocava a mão na nossa perna. Se a gente estava sentada num lugar, ele chegava do nada fazendo uma massagem que apertava bem o ombro. A gente ficava bem tensa com aquilo. Ele dava beijo no rosto já chegando perto da boca - detalha a ex-aluna.
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A vítima relatam que ele costumava ficar amigo dos alunos. Segundo ela, certa vez, o professor teria dito que estava namorando outra menina, que também seria aluna do mesmo curso.
- Ele dizia que, como ela era "menor de idade", e ele era bem mais velho, o relacionamento era algo que tinha que ser escondido, que os pais e professores não podiam ficar sabendo porque iria trazer uma imagem negativa para a instituição. Até que eu fiquei próxima da menina que ele supostamente estava namorando e descobri que aquilo era mentira - relata.
A ex-aluna recorda, ainda, que quando se esquivava do contato físico, o professor reagia como vítima:
- Quando a gente demonstrava que não gostava, ele se fazia de coitado, dizia: "ah, por que tu estás fazendo isso comigo?", "tu não me amas mais?", "eu sou teu amigo". E a gente ficava se sentindo muito mal.
Outra vítima diz que percebe hoje como o formato das aulas e avaliações eram estratégias para que ele se aproximasse das alunas. Foi em uma atividade no pátio da escola, enquanto fazia exercícios no caderno, que ela teria sofrido um dos abusos:
- Eu estava sentada fazendo exercícios, e ele chegou por trás e me abraçou e passou a mão no meu peito. Eu lembro que fiquei apavorada, minha reação foi levantar rápido e sair de perto, fingir que ia no banheiro, tomar água. Nem comentei com ninguém, nem em casa, fiquei pensando que foi sem querer, que estava maliciando.
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A jovem diz, ainda, que em várias oportunidades ele teria passado a mão na perna dela, pegava na mão, falava baixinho e até teria chamado de "meu amor".
Uma terceira ex-aluna disse que, quando foi aluna dele, tinha um namorado e que o professor dava opiniões de que o rapaz não a "merecia". Segundo a vítima, ele argumentava que ela era madura e merecia alguém mais velho. Depois, quando ela já não namorava mais, o professor passou a ser mais "invasivo".
A menina narra um episódio durante uma prova oral em que teria sofrido uma espécie de "represália":
- Eu estava respondendo a uma pergunta e ele botou a mão na minha coxa e pediu para eu me acalmar e prestar atenção nele, para ficar tranquila. Eu me afastei, tirei a perna, ele pegou na minha mão e falou para que eu prestasse atenção nele. Ele descontou metade da nota e falou que eu não tinha prestado atenção nele, que ele tentou me ajudar e eu não quis. Na época, aquilo foi muito confuso para mim porque eu sempre ia muito bem na disciplina dele.
A mesma vítima também descreve o comportamento do professor no ambiente escolar, mesmo antes de ele ser professor dela:
- Ele encontrava a gente no corredor, abraçava, com aqueles abraços apertados. Cheirava o pescoço e falava o quanto a gente estava crescendo e ficando lindas e o quanto ele estava ansioso para ser nosso professor.
REFLEXOS
O impacto dos acontecimentos do passado ecoa até hoje para as vítimas. Uma delas disse que ainda tenta elaborar os sentimentos.
- No fundo do meu coração, eu sei que não sou culpada, mas a gente fica pensando: por que eu o deixei passar a mão em mim? Eu me sentia muito incomodada, mas eu não queria acreditar que aquilo era uma coisa a mais, eu pensava que ele era meu amigo, meu professor de história - reflete.
O medo de comentar a sensação de desconforto com as abordagens do professor é outro lugar comum entre as vítimas:
- Fui tomada pelo discurso da época. Pensava: "não vou falar nada, porque não é nada demais". Percebi que é um processo quase que automático da gente se desvalidar, se desconsiderar. Retomar isso com amigas, se dar conta da vulnerabilidade que a gente tinha na época. É muito difícil.
Outra vítima, que conversou com mais meninas que passaram pela mesma situação, disse que muitas usam medicamentos e fazem acompanhamento psicológico para tratar as sequelas do que sofreram.
- Espero que as escolas tomem consciência e implementem algum tipo de orientação e amparo para que isso não aconteça com outras meninas - declara.
CONTRAPONTO
No dia 5 de outubro, após denúncia do MP, a reportagem ligou para o professor. Um familiar atendeu o telefone e disse que, naquele momento, não se manifestariam em relação ao caso. Neste dia, o familiar também informou que o advogado que defendia o professor quando ele foi indiciado não estava mais no caso, e que Vinícius constituiria uma nova defesa no momento em que fosse citado no processo. Nesta sexta-feira, o Diário tentou contato com o professor novamente por telefone, mas as ligações não foram atendidas. A reportagem também entrou em contato pelo WhatsApp, mas não teve as mensagens respondidas.